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quarta-feira, 17 de março de 2010

Guerra ao Terror

A cada 365 dias, muda o grupo de soldados americanos do esquadrão antibombas em solo iraquiano.
Em conversa com espécie de psicólogo de guerra, um dos soldados de grupo a poucos dias de retornar para casa questiona o sentido de ideias como “ser o melhor possível aquilo que se possa ser”... E ele quer saber o que seria se o melhor que puder ser for um corpo caído no chão...
É no que logo se torna um carismático membro do grupo, que acaba sendo substituído por soldado aparentemente mais identificado com a função de desarmar bombas do que com a própria história de sua vida.
Entre os problemas causados por sua incapacidade de valorizar qualquer coisa que não a sua missão com a bomba de cada dia, alguns flashes do filme acabam acenando para sua humanidade, identificada em suas breves conversas com Beckan, menino iraquiano que vive de vender vídeos e outras coisas aos soldados...
O rebelde mestre antibombas parece fazer um caminho estranho dentro de si mesmo: ao invés do carinho por seu filho acabar por se refletir em sua capacidade de ser generoso com outra criança, é a ternura e a empatia em relação a Beckan que fá-lo lembrar-se pela primeira vez com alguma emoção do próprio filho – e ele até tenta uma ligação telefônica...
De certa forma, talvez ele encarne espécie de caricatura do sentimento experimentado por seu colega em análise psicológica... Talvez seja preciso aceitar em definitivo o lugar e a história que lhe sejam possíveis naqueles terríveis 365 dias. Como se fosse para sempre. Como se a permanente possibilidade mesma de morrer em solo estranho, em nome de questões nem sempre bem compreendidas, pudesse, de repente, ser mesmo o seu melhor possível... E isso simplesmente porque o tempo não passaria se sua alma buscasse lugar melhor do que aquele para esperar por seu corpo... Definitivamente, era preciso estar ali por inteiro. E estar ali por inteiro era aceitar - de maneira mais consciente do que aquela à qual estão obrigados os outros mortais – a possibilidade de ser interrompidos a qualquer momento. Como se isso fosse o me-lhor pos-sí-vel.
Tocado por Beckan, ao tomá-lo por morto, sua reação nos leva a imaginar que todos os seus sentimentos virão à tona... E ele procura desvendar o ocorrido com o menino como se procurasse pela razão de sua própria existência... Como se procurasse por si mesmo...
Em algum momento, no entanto, temos a impressão de que Beckan não morrera... Ou seria um menino com ele muito parecido, a viver do seu mesmo modo, o que vemos então em cena?

Acusado pelos colegas de ser viciado em adrenalina, a impressão que nos fica, ao vermos o bravo soldado, de volta ao lar, incapaz de saborear sua tranquila vida de classe média americana; atrapalhado entre a mulher e o filho – dois estranhos? –, e entre a compra de sucrilhos e o conserto do telhado, é de que não lhe fosse possível suportar a ideia de simplesmente esquecer que aquele mundo colocado de cabeça para baixo continuava lá...
Quando o encontramos pronto para mais 365 dias no Iraque, temos certeza de que, mais do que para aumentar sua coleção de bombas desarmadas, ele fora em busca de seu melhor possível... Quem sabe, ajudar aqueles meninos Beckans a acreditarem em um melhor possível de fato algum dia melhor...

Obs. O filme não é para nos posicionarmos contra ou a favor da guerra no Iraque. É para lembrar-nos do quanto tantos soldados também são vítimas da política de seus próprios países, meros seres humanos. Veja aqui também o texto sobre o filme "O Menino do Pijama Listrado".