Como em outras obras de Honoré de Balzac, a crítica à
humanidade há muito desviada dos melhores valores recebe especialíssimo
tratamento literário em “O Coronel Chabert”, levando o leitor a passar sem
sentir de uma a outra página, sempre desejoso de mais e mais informações sobre as
figuras ali descritas.
O autor de “Os Enamoramentos”, Javier Marías, que
recentemente recusou importante prêmio concedido pelo Ministério da Cultura
espanhol, segundo ele, “para não comprometer sua independência em relação ao Estado”,
cita “O Coronel Chabert”, ao longo do citado romance, através de um de seus
personagens...
Até que ponto pode chegar o ser humano em função de seus
objetivos, em função de suas vaidades, em função do que lhe pareça algum tipo
de sucesso?
Enquanto o personagem de Marías parece convencido dos
motivos que lhe justificam os atos – inclusive, citando Balzac ( em uma leitura
provavelmente não desejada pelo autor de “A Comédia Humana”, e que acaba por
nos lembrar o filósofo francês Jacques Rancière, para o qual “assim como o
pedagogo não pode achar que está lidando com aprendizes incapazes, um artista
não pode tentar antecipar o que o espectador deve ver ou compreender.”) –, o de
Balzac, após inúmeros percalços, declara:
“O senhor não pode saber até onde vai meu desprezo por esta
vida exterior a que a maioria dos homens tanto se apega. Fui subitamente
acometido por uma doença, o desgosto pela humanidade. [...], é melhor ter luxo
em seus sentimentos do que em seus trajes. Não temo, quanto a mim, o desprezo
de ninguém.”
Em entrevista concedida ao jornal “O Globo”, Javier Marías
corrobora seu posicionamento diante de algumas premiações, citando o austríaco Thomas
Bernhard:
“Prêmios em geral não constituem honra nenhuma, honra é uma
perversidade, não existe honra no mundo. As pessoas chamam de honra o que é, na
verdade, infâmia.”
Assim, àqueles que se consideram um sucesso, e não
compreendem as angústias e/ou dúvidas que, volta e meia, vêm persegui-los; e àqueles
que, sem titubear, se consideram simplesmente grandes fracassados, desejo que o
ano de 2013 lhes venha sublinhar uma nova consciência.
Nos primeiros, a de que qualquer tipo de sucesso galgado à
custa do crédito nascido de algum tipo de exploração da ignorância alheia, ou
mediante o próprio autoengano, obviamente sem o respaldo da inconfundível paz de espírito, simplesmente
não é compreendido como sucesso pelo “observador” interior.
Nos segundos, a de que talvez apenas não estejam conseguindo
perceber o quanto de sucesso existe em suas vidas, simplesmente porque vivem
mergulhados nas definições e parâmetros traçados pelo grupo anterior.
Há pouco tempo, a imprensa divulgou nota segundo a qual o
Banco Central fora condenado a pagar multa por danos morais por impedir a
contratação de vigilantes terceirizados com nome no registro de devedores dos
serviços de proteção ao crédito.
Apesar de alguns considerarem justificada a proibição da
contratação de pessoas endividadas para trabalhos que exijam o contato com
dinheiro, parece haver prevalecido a certeza de que estar endividado, por si
só, não acena para qualquer desvio de caráter. Principalmente em vista do
flagrante fato de que muitos dos enricados indevidamente nunca atrasam o
pagamento de suas contas simplesmente por ser-lhes bastante fácil pagá-las com
o dinheiro alheio.
Enfim, como vimos acima, nem os ditos “prêmios”, espécie de
reconhecimento público do sucesso de alguém, podem ser considerados sem
reservas... Pois – talvez com algumas exceções e dentre outras razões- parece que quanto mais eles envaidecem, mais
submetem.
E como, às vésperas de Ano Novo, o sucesso é um dos votos
mais emitidos por todos a todos a sua volta, a cada um de vocês, desejo, sim,
um 2013 de muito sucesso. Mas em forma de Consciência.
Talvez seja ela bastante
menos palpável do que as comumente buscadas formas de sucesso, mas, sem sombra
de dúvida, é a única indiscutível.