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quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

O Coronel Chabert

Como em outras obras de Honoré de Balzac, a crítica à humanidade há muito desviada dos melhores valores recebe especialíssimo tratamento literário em “O Coronel Chabert”, levando o leitor a passar sem sentir de uma a outra página, sempre desejoso de mais e mais informações sobre as figuras ali descritas.
O autor de “Os Enamoramentos”, Javier Marías, que recentemente recusou importante prêmio concedido pelo Ministério da Cultura espanhol, segundo ele, “para não comprometer sua independência em relação ao Estado”, cita “O Coronel Chabert”, ao longo do citado romance, através de um de seus personagens...
Até que ponto pode chegar o ser humano em função de seus objetivos, em função de suas vaidades, em função do que lhe pareça algum tipo de sucesso?
Enquanto o personagem de Marías parece convencido dos motivos que lhe justificam os atos – inclusive, citando Balzac ( em uma leitura provavelmente não desejada pelo autor de “A Comédia Humana”, e que acaba por nos lembrar o filósofo francês Jacques Rancière, para o qual “assim como o pedagogo não pode achar que está lidando com aprendizes incapazes, um artista não pode tentar antecipar o que o espectador deve ver ou compreender.”) –, o de Balzac, após inúmeros percalços, declara:
“O senhor não pode saber até onde vai meu desprezo por esta vida exterior a que a maioria dos homens tanto se apega. Fui subitamente acometido por uma doença, o desgosto pela humanidade. [...], é melhor ter luxo em seus sentimentos do que em seus trajes. Não temo, quanto a mim, o desprezo de ninguém.”
Em entrevista concedida ao jornal “O Globo”, Javier Marías corrobora seu posicionamento diante de algumas premiações, citando o austríaco Thomas Bernhard:
“Prêmios em geral não constituem honra nenhuma, honra é uma perversidade, não existe honra no mundo. As pessoas chamam de honra o que é, na verdade, infâmia.”
Assim, àqueles que se consideram um sucesso, e não compreendem as angústias e/ou dúvidas que, volta e meia, vêm persegui-los; e àqueles que, sem titubear, se consideram simplesmente grandes fracassados, desejo que o ano de 2013 lhes venha sublinhar uma nova consciência.
Nos primeiros, a de que qualquer tipo de sucesso galgado à custa do crédito nascido de algum tipo de exploração da ignorância alheia, ou mediante o próprio autoengano, obviamente sem o  respaldo da inconfundível paz de espírito, simplesmente não é compreendido como sucesso pelo “observador”  interior.
Nos segundos, a de que talvez apenas não estejam conseguindo perceber o quanto de sucesso existe em suas vidas, simplesmente porque vivem mergulhados nas definições e parâmetros traçados pelo grupo anterior.
Há pouco tempo, a imprensa divulgou nota segundo a qual o Banco Central fora condenado a pagar multa por danos morais por impedir a contratação de vigilantes terceirizados com nome no registro de devedores dos serviços de proteção ao crédito.
Apesar de alguns considerarem justificada a proibição da contratação de pessoas endividadas para trabalhos que exijam o contato com dinheiro, parece haver prevalecido a certeza de que estar endividado, por si só, não acena para qualquer desvio de caráter. Principalmente em vista do flagrante fato de que muitos dos enricados indevidamente nunca atrasam o pagamento de suas contas simplesmente por ser-lhes bastante fácil pagá-las com o dinheiro alheio.
Enfim, como vimos acima, nem os ditos “prêmios”, espécie de reconhecimento público do sucesso de alguém, podem ser considerados sem reservas... Pois – talvez com algumas exceções e dentre outras razões- parece que quanto mais eles envaidecem, mais submetem.
E como, às vésperas de Ano Novo, o sucesso é um dos votos mais emitidos por todos a todos a sua volta, a cada um de vocês, desejo, sim, um 2013 de muito sucesso. Mas em forma de Consciência.
 
Talvez seja ela bastante menos palpável do que as comumente buscadas formas de sucesso, mas, sem sombra de dúvida, é a única indiscutível.