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sábado, 5 de setembro de 2009

ASSÉDIO MORAL II

“Nas sociedades de nosso mundo ocidental altamente industrializado, o local de trabalho constitui o último campo de batalha em que uma pessoa pode matar outra, sem qualquer risco de chegar a ser processada diante de um tribunal.” Heinz Leymann



Esta citação abre o livro “MOBBING ( como sobreviver ao assédio psicológico no trabalho )”.
De leitura indispensável para todos aqueles que se sintam vítimas das mais sutis às mais terríveis agressões no ambiente de trabalho, esse livro, do psicólogo do trabalho e professor da Universidade Complutense de Madri, Iñaki Piñuel Y Zabala, é também interessante leitura para os que participam ou se sentem propensos a participar como agressores de qualquer ação que possa ser caracterizada como assédio moral.

Desde os perfis tanto das vítimas mais comuns de assédio moral e de seus assediadores, até uma profunda análise do problema hoje no mundo podem ser encontrados nas mais de 300 páginas dessa obra de fundamental importância para quem queira se aprofundar no assunto. Inclusive buscando conhecer um pouco mais sobre si mesmos e sobre o como estão sendo vistos pelos especialistas.

Aqui, a título de aguçar a curiosidade de vocês, cito algumas passagens emblemáticas do conteúdo da obra, cujo objetivo principal parece ser mostrar o quanto o assediador conta com a desmoralização e com o enfraquecimento da autoestima de sua vítima para se certificar de que, ainda que ele tente reagir – reações nem sempre configuram uma boa ideia -, jamais saibam como de fato lhes dar uma resposta.

Lembrem-se de que o que segue é apenas uma pequena amostra do que encontrarão nas páginas dessa publicação. Mesmo dos temas que destaco apenas lhes passo umas pinceladas. Vale a pena dedicar-se à leitura completa de trabalho tão sério como esse.


“Perfil profissiográfico das vítimas do psicoterror no trabalho:

“Elevado grau de Ética, honradez e retidão, assim como elevado senso de justiça ( fazem as perguntas-chave e incômodas, que ninguém ousa formular; denunciam as situações indignas ou injustas para outros; são livres, divergindo da opinião oficial ou do pensamento único que leva a ocultar alguns fatos; não se deixam comprometer com prebendas, dinheiro, postos, promoções, em troca de ser um bom menino e ficar quieto; falam claro e chamam as coisas por seus nomes, eliminando a distância entre o dito e o feito nas grandes declarações de princípios que se fazem em muitas organizações; não são politicamente corretas, falando de temas, valores e situações que são tabu na organização; buscam a verdade dos fatos e não o compromisso viável das versões oficiais etc. ).
“Autônomas, independentes e com iniciativa ( não cerram fileiras em torno de cegos corporativismos ou falsos sentimentos de lealdade devida à organização; conseguem respeitar a hierarquia sem cair no servilismo ou na submissão inconsciente etc. )
“Altamente capacitadas por sua inteligência e suas aptidões, destacam-se por seu brilhantismo profissional ( obs. nossa: ou poderiam fazê-lo, se tivessem chance ).
“Elevada capacidade empática, sensibilidade, compreensão do sofrimento alheio e interesse pelo desenvolvimento e bem-estar dos demais.
“Portadoras de situações pessoais ou familiares altamente satisfatórias e positivas.”


“Perfil do assassino moral:

“Quando uma cifra auspiciosa se torna especialmente proeminente e relevante, a maioria das pessoas se rende à idolatria do êxito. Ficam cegas diante do correto e do incorreto, do verdadeiro e do falso, do jogo limpo e do jogo sujo.
“...À proposição de que o êxito é bom, segue-se outra que tende a estabelecer as condições para a continuação do êxito. Essa proposição sustenta que o êxito é o único que é bom...
“A faculdade crítica moral e intelectual torna-se obnubilada. Fica deslumbrada pelo brilho do homem bem-sucedido e pelo anseio de participar de alguma maneira desse êxito... Só tem olhos para a realização, para o resultado promissor.
“Chega-se a ignorar que a culpa é cicatrizada com o êxito, precisamente porque já não se conhece a culpa ( obs. nossa: psicopaticamente... ). O êxito é um bem sem igual.
“Só se pode adquirir esta atitude no caso de uma profunda hipocrisia interna, de um autoengano consciente. Chega-se então a uma corrupção interna cuja cura é muito difícil de conseguir."
DIETRICH BONHOEFFER, Ética

"Características psicológicas do perseguidor moral:

“O medo e a insegurança que experimentam em relação a suas próprias carreiras profissionais, sua própria reputação ou sua posição na organização impelem-nos a denegrir outras pessoas.
“Esse medo, essa insegurança são habitualmente determinados pela própria consciência de mediocridade, que é posta em evidência, muito amiúde de maneira inconsciente, pela conduta profissional, ética e respeitosa da pessoa que depois vem a ser selecionada como objetivo.
“Os sentimentos de inadequação apresentados pelos assediadores usualmente procedem, como posteriormente se verá, de múltiplas fontes possíveis: psicopatias, paranoia, transtornos narcisistas... tendo, porém, um mesmo efeito sobre o comportamento: a compulsão por fazer desaparecer do ambiente à volta do assediador ou assediadores aqueles estímulos que desencadeiam neles sentimentos patológicos de ameaça, vale dizer, a eliminação da vítima.”


Com nossas palavras ( está no livro de forma melhor elaborada ):
Infelizmente, quando alguém começa a ser vítima de algum tipo de assédio moral do qual participem pessoas hierarquicamente superiores, a tendência daqueles que estão a uma certa distância ou que não participem da agressão é aliviar a própria consciência – por nada fazerem em sua defesa – dizendo-se precipitada, submissa e levianamente, um “alguma coisa deve ele(a) ter feito”. Assim, constituem-se as “testemunhas mudas”, até porque passam a ter medo de serem as próximas vítimas daquela espécie de ritual macabro.
Isso, aliado à autoestima ferida do perseguido, cria o campo propício para que os assassinos morais dêem continuidade ao projeto criminoso.


Dentre os direitos essenciais atropelados pelo psicoterror elencados no livro, destacamos:


“Atropelo do direito à intimidade ou à inviolabilidade da informação confidencial que afeta a pessoa.
“Realizam-se tentativas ilícitas de receber informação confidencial acerca da pessoa...
“Atropelo do direito à honra, ao bom nome ou à reputação mediante a calúnia consciente, intencionada e repetida.
“O assediador leva a efeito falsas imputações de erros ou descumprimentos e proporciona dados ou informes negativos falsos, com detalhes e declarações que não correspondem à realidade do desempenho da vítima. A razão apóia-se em facilitar argumentos falsos para livrar-se da vítima ou impedir que ela encontre facilmente um novo trabalho depois de sair da organização ( obs. nossa: até porque se o assediado tiver oportunidade de demonstrar seu valor em outro emprego, pode ficar mais evidente a perversidade sofrida anteriormente )."

Enfim, devo lhes dizer que o autor de trabalho tão completo, ao final, depois de muitas outras abordagens às quais aqui sequer fiz referência, não poderia deixar de esclarecer que a melhor libertação de todo o sofrimento provocado, principalmente pela injustiça sofrida, é sem dúvida o PERDÃO.

Sem, no entanto, tentar-se fugir à dor experimentada.
Para lidar com ela, com a dor, Iñaki sugere que se preste atenção às palavras de Krishnamurti:
“Posso compreender o que é o sofrimento quando uma parte de minha mente está escapando em busca da felicidade, de uma saída para essa desventura? Portanto, se tenho de compreender o sofrimento, não devo estar completamente unido a ele, sem rechaçá-lo, sem justificá-lo nem condená-lo, nem compará-lo, mas permanecendo completamente com ele e compreendendo-o?”

E compreendendo-o, pode-se, a partir da própria postura diante da vida, colaborar no processo de ampliação da consciência, seja das demais vítimas, para que encontrem alívio; seja das testemunhas mudas, para que sempre confiram aos assediados o benefício da dúvida; seja daqueles que por pouca familiarização com seus melhores aspectos se descubram do lado dos ASSASSINOS DE PESSOAS VIVAS e, não sendo completos psicopatas, possam descobrir no fundo de seus corações um começo da digna VERGONHA a apresentar-lhes oportunidade de seguir o caminho da humanização, da saúde e da consciência tranquila.


SHEILA MARIA MADASTAVICIUS