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terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Você vai conhecer o homem dos seus sonhos

Em “Tudo pode dar certo”, tive a impressão de que Woody Allen se aproximara de uma espécie de tranquilidade lúcida diante do absurdo da vida e da humanidade...

No entanto, em “Você vai conhecer o homem dos seus sonhos”, sou obrigada a admitir que o cineasta deixa-se pender novamente para espécie de irônico e desconfortável pessimismo...

Não é a primeira vez que as palavras que abrem suas histórias são aquelas mesmas que podem ser tomadas como resumo da mensagem que deseja registrar... Assim é que, lembrando Shakespeare, a voz narradora do filme nos fala que a vida é plena de sons e fúria a resultarem em absolutamente nada...

Como boa obra de arte, a verdade é que “Você vai conhecer...” consegue reproduzir a ideia apresentada tanto em seu conteúdo quanto em sua forma: ao final do filme, ficamos mesmo com a sensação de que, apesar de algumas promessas ( som e fúria? ), fomos arremessados no mais absoluto nada... Nada esse coroado pelas palavras do narrador que, fechando a última cena, faz questão de frisar o quanto a ilusão pode ser nossa única chance de felicidade...

Prefiro os sentimentos provocados em mim por “Tudo pode dar certo” ( procure aqui o texto em maio/10 ). Mas respeito o momento do cineasta, certa de que muitas vezes esse “retrocesso” pode representar futuro aprofundamento nas questões pelas quais tenha sido cortejado durante a realização do outro filme.

Afinal, Fernando Pessoa já nos dizia que o maior sentido da vida é não ter ela sentido algum... E, no entanto, é também lendo seus belos textos que acabamos por descobrir o quanto tal consciência é justamente – adoro os paradoxos da existência! - aquela que, ao nos levar a abdicar do obsessivo desejo de encontrarmos para nossa vida um sentido egoísta no qual possamos satisfazer nossas vaidades umbilicais, acaba por nos mostrar que a solidariedade com cada outro indivíduo arremessado no mesmo absurdo existencial pode representar a verdadeira razão de nossa existência.

Obs. De qualquer forma, os personagens Greg e sua amante, ainda que pertencentes a um plano secundário, ao parecerem de certa maneira harmonizados em suas vidas, levam-nos a pensar que os “sons e fúrias” que não levam a lugar algum talvez sejam aqueles resultantes dos desejos essencialmente egoístas e pequenos.

Como os do escritor medíocre e de sua esposa, esta última tão preocupada com o próprio umbigo que sequer se incomodou com o fato de sua mãe consultar uma vidente charlatã, desde que isso não afetasse sua própria vida...


Como os do velho - vivido por Anthony Hopkins - ansioso por negar a passagem do tempo...